Autor Tópico: Túnel de vento - BMW Motorrad  (Lida 1385 vezes)

Julho 24, 2017, 11:38:41, 11:38
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lmferreira

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  • Marca Motociclo: Honda
  • Modelo Motociclo: NC 750X
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Para compreender a influência da aerodinâmica nos motociclos visitámos o túnel de vento do Grupo BMW, onde são desenvolvidos os estudos aerodinâmicos, acústicos e de fiabilidade dos seus diversos modelos. Aqui, todos os tipos de motos são submetidos a correntes de vento, temperaturas extremas, condições de elevada humidade e, até mesmo, chuva, de forma a testar as soluções de engenharia desenvolvidas pelos técnicos da marca. Designs de carenagem e ecrã são desenvolvidos e posicionados de forma a encontrar uma solução simultaneamente capaz de proporcionar o maior conforto térmico e acústico e que reduza a resistência aerodinâmica.

Por sua vez, o motociclo consegue também alcançar maior velocidade de ponta e reduzir os consumos num equilíbrio constante com outros apêndices, cuja funcionalidade pode ser oposta, criando resistência em sítios chave, melhorando a força descendente e, por consequência, a estabilidade e aderência. Tudo isto forma um jogo altamente complexo que os engenheiros têm de descortinar no desenvolvimento de cada modelo.

Tal é a complexidade deste tema que o Grupo BMW já conta com um departamento focado na aerodinâmica dos motociclos desde 1994, ano do nascimento da R 1100 RT, onde designers e engenheiros aerodinâmicos trabalham lado a lado para promover o bem-estar de homem e máquina, através da proteção contra as forças da natureza e da garantia de refrigeração ótima do motor e extração dos gases do sistema de escape.

No século passado, a estreia de uma solução técnica era precedida de um desenvolvimento feito através da experiência empírica. Com o passar dos anos, este processo extremamente demorado passou a ser substituído pela investigação científica e cálculo matemático suportado pelo advento da eletrónica, que permitia realizar simulações altamente complexas em computador. Este tipo de investigação torna-se possível para a BMW em 2010 com a inauguração do seu novo túnel de simulação ambiental localizado a norte de Munique, onde se tornou possível testar, não só a ação do vento nos motociclos, mas também a influência de temperaturas extremas e até mesmo chuva, com a capacidade de recriar todos os cenários à face da terra.

“Antigamente, tínhamos de pegar numa mochila e levar a moto até um lugar quente para avaliar como os balanços térmicos funcionavam, a uma temperatura ambiente de 35ºC e para testar várias coisas como, por exemplo, se o condutor consegue suportar o calor do motor”, explica Helmut Diehl, Diretor de Desenvolvimento Funcional da BMW Motorrad. “Dados os timings de desenvolvimento atuais, isto seria completamente impossível. Para além disso, as condições climatéricas não eram garantidas, tínhamos flutuações sensíveis nas temperaturas, vento e nas condições locais, que desviavam os nossos resultados. No túnel de simulação ambiental podemos ajustar tudo ao detalhe exatamente como queremos” - condições como a intitulada “Warmland” (terra do calor), um cenário onde se simulam condições de temperatura de 35ºC onde os motociclos circulam artificialmente durante várias horas. “Nestas condições, tudo funciona de acordo com o expectável”, afirma Armin Hirn, ao explicar que todos os componentes do motor funcionam sem qualquer esforço ou perigo adicional e o condutor artificial, equipado com vestuário recomendado, não é “cozido” pelos gases de escape ou pelo vento agreste. “Mesmo que os sensores marquem 50ºC na superfície do vestuário, é totalmente aceitável. Aos 60ºC passamos o ponto de falha onde somos obrigados a realizar alterações pelo bem do condutor”. Nesta situação, os designers e engenheiros reúnem-se de forma a estudar uma configuração alternativa para o componente em causa. Este procedimento é sempre seguido de uma alteração ao nível da proteção do condutor ou do arrefecimento do motor.

Os técnicos podem também criar chuvadas artificiais no túnel, através de bocais colocados na frente da moto. O tapete no qual a moto se “desloca” pode ser acelerado até 250 km/h, pelo que o efeito de spray do asfalto também pode ser recriado. A esta água, uma mistura especial que a marca consegue extrair das condutas de metro de Munique, é adicionado um elemento de contraste denominado Zinopal que, como pode ver na página anterior, torna visíveis as gotículas de fluido que se acumulam na carenagem. “Contamos todas as gotas!” afirma Toine Ruhe, responsável pelas carenagens de todos os modelos da BMW Motorrad.

Há uns anos atrás teria de ser o piloto de testes a declarar que quantidade de chuva sentiu aos comandos dos protótipos durantes os muitos meses de testes. Atualmente, os técnicos conseguem calcular exatamente quantas gotas de água caíram em todos os pontos da carenagem, de forma a avaliar a pressão de ar que se faz sentir em cada ponto, isto sem utilizar até qualquer túnel de vento!

Graças a um conjunto de 10.000 processadores que têm a tarefa de realizar até 100 simulações por modelo, é possível recriar em computador os testes que são realizados durante vários dias em túnel de vento… mas, mesmo assim, ainda demoram 25 horas a completar cada uma das simulações! No entanto, o tempo e, sobretudo, o custo do software de simulação (que entra na casa dos sete dígitos), vale a pena, pois reduz o tempo necessário por cada modelo no túnel de vento em metade. Não é, então, uma surpresa saber que os engenheiros lutam tanto por tempo em frente ao simulador como por tempo nos túneis de vento.

Pascal Ewerth, um dos especialistas deste avançado software, conta-nos a logística por trás doutro importante passo de desenvolvimento que ocorre dentro do túnel de vento: afinar o som.

“As motos são muito mais fáceis de afinar que os automóveis. Precisamos de cerca de 20 pessoas em volta de um carro para conseguir encontrar o compromisso acústico perfeito. Nas motos, como foi o caso da R 1200 RT, por vezes até nos basta só confirmar no túnel a informação que obtivemos nas simulações. No entanto, na maioria dos veículos utilizamos todas as ferramentas à nossa disposição, nomeadamente a simulação, o túnel de vento e os testes com pilotos para alcançar o desenvolvimento mais rápido e fiável”. No caso específico da aeroacústica, a experiência empírica assume um papel muito relevante pois, mesmo com o melhor microfone e software do Mundo, apenas o ouvido humano consegue analisar com fidelidade a acústica da moto e como esta é influenciada pelo vento. Gerhard Hafer, engenheiro aeroespacial dedicado ao estudo da aerodinâmica e do ruído do vento em redor dos veículos, explica-nos que “cada moto emite um som distinto” pelo som do motor e pela forma como “corta” o ar em seu redor, um fator tão importante como o som do escape. Exemplo disso é a K1600GT, cujo ecrã especialmente desenvolvido transmite apenas 83 dB ao condutor, apesar do seu grande motor de 6 cilindros.
 
 
Então e as “asas”?

Rodar em pista tem apenas um objetivo prático: percorrer determinada distância no menor tempo possível. Para além do papel que desempenha no desenvolvimento dos veículos de estrada, a aerodinâmica tem uma tarefa ainda mais crucial neste ambiente de pista, principalmente nas competições motorizadas. Se, em reta, o perfil aerodinâmico deve ser o mais fluido possível de forma a não oferecer resistência ao vento, maximizando assim a velocidade de ponta, em curva é necessário complementar a aderência mecânica dos pneus e do chassis com carga aerodinâmica, de forma a conseguir manter em curva a maior velocidade possível.

A aplicação mais extrema deste paradigma pode ser vista na Fórmula 1, onde enormes asas frontais e traseiras são responsáveis por direcionar o ar, não de forma a afastá-lo do carro, mas sim como forma de o “colar” ao chão. Entre as duas asas encontramos diversos canais e estruturas como o fundo plano, que contribuem para uma maior carga aerodinâmica e por consequência, aderência ao asfalto.

Bebendo talvez dos ensinamentos desta e de outras formas de desporto automóvel, assistimos na época de 2016 à criação, por parte de todos os fabricantes em competição no Campeonato Mundial de MotoGP, de apêndices aerodinâmicos, vulgo “asas”, destinados a melhorar o comportamento dos protótipos em curva.

 Mas, como funcionam na prática? A forma mais convencional das asas, inicialmente estreadas pela Ducati e rapidamente adotadas por fabricantes como Yamaha, Honda, Suzuki e Aprilia, estão localizadas na parte inferior da carenagem frontal e na parte frontal da carenagem lateral, no caso específico da Ducati. Estes apêndices produzem uma força descendente na forquilha que “empurra” o pneu frontal contra o asfalto. Esta situação é útil em duas situações: na travagem para as curvas, onde o aumento da aderência permite aos pilotos travar mais e mais tarde sem medo de perder a frente, e na aceleração à saída das curvas onde, naturalmente, o enorme binário do motor tem tendência a levantar a roda da frente do asfalto o que diminui o controlo sobe a moto. No entanto, a forma destes apêndices foi bem estudada pelas equipas pois, teoricamente, em reta estes apêndices diminuem a velocidade de ponta ao oferecer alguma resistência, algo que o motor da GP16 não parece ter tido dificuldade em acomodar, e nas curvas, dado o ângulo de inclinação das motos e das respetivas asas, poder teoricamente gerar uma força lateral que obriga os pilotos a “puxar” a moto para o interior da curva.

Com efeito, em entrevista a um órgão de comunicação norte-americano, Shuhei Nakamoto, Vice-presidente do HRC, revelou que há mais de 20 anos a Honda desenvolveu o que na altura considerou ser a moto aerodinamicamente perfeita para a competição, capaz de rodar em Suzuka em menos um segundo e meio do que a moto com a qual a Honda disputava o Mundial de Velocidade.

No entanto, esta moto nunca chegou a ser mostrada pois o piloto de testes não era capaz de dar mais do que uma volta com a mesma, devido à exigência física da condução, algo com o qual os pilotos de Fórmula 1 têm de lidar dentro do carro em situações onde alcançam picos de 5G.No entanto, face à falta de um consenso sobre esta matéria, em 2017 as “asas” foram proibidas.